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Quando o fracasso é notícia

25 de jul. de 1988

Veículo: Folha da Tarde
Coluna: Parem as rotativas

A partir de agora – e sabe-se lá até quando – esta coluna vai abrir espaço para registrar grandes histórias que a Imprensa não costuma divulgar e que os próprios protagonistas muitas vezes escondem com o maior cuidado. Relatos e casos exemplares, que podem ajudar milhares de brasileiros e brasileiras a encontrar seu caminho, descobrir a saída, resolver um problema.

A idéia não é minha, devo confessar. E apareceu de um jeito, digamos, meio constrangedor. Foi num debate com estudantes de jornalismo, aqui em São Paulo. Eu já tinha respondido meia dúzia de perguntas, quando o professor que estava a meu lado disparou, de surpresa: “Você está falando da sua carreira, da profissão, do que tem feito de bom. Do seu sucesso, enfim. Mas eu gostaria que você contasse pra gente um pouco do seu fracasso também”. Depois de recuperar o controle, passei mais de uma hora rememorando alguns dos muitos episódios em que quebrei a cara, por assim dizer, em termos pessoais ou profissionais. E deu o maior Ibope.

Esta semana, conversando com alguns dos mais bem sucedidos publicitários brasileiros, constatei que nem eles agüentam mais ler – e ouvir – tantas histórias de sucesso na propaganda tupiniquim. Cristina Carvalho Pinto, vice-presidente de criação da Norton, lembrou de uma entrevista de Alfredo Marcantônio, publicada numa revista inglesa. Marcantônio, que apesar do nome é inglês e um dos maiores homens de criação do mundo, saiu da agência onde trabalhava para uma empresa maior e meio decadente. E na tal entrevista, admitiu com todas as letras que está comendo o pão que o diabo amassou. O que fez a Cristina confirmar a distância que ainda separa muitos profissionais brasileiros de seus colegas mais desenvolvidos (e mais bem pagos).

Isso tudo é para deixar claro, bem claro, que a decisão de passar a contar aqui histórias de fracasso não foi uma brilhante sacada do autor desta coluna. E para que ninguém diga que estou apenas confirmando o ditado sobre pimenta nos olhos dos outros, atiro a primeira pedra...em mim mesmo.

Nem no analista consegui descobrir, qual foi o meu primeiro fracasso. O mais antigo, ao que me lembro, é minha performance numa corrida de saco, lá pelo segundo ano primário. Fiquei em último. Esporte, aliás, nunca foi o meu departamento. Tanto que jamais vou esquecer do jogo de basquete – eu era mais alto que os outros garotos e sempre escalado para o time – em que apanhei a bola no momento em que o juiz a ergueu, dando início à partida, driblei três ou quatro jogadores e acertei um arremesso maravilhoso. Dois a zero para o adversário, na primeira – e única – cesta contra a história desse nobre esporte, segundo consta. A experiência tornou-se realmente inesquecível diante da pedagogia do professor: ele me pegou literalmente pelas orelhas e me botou para fora do campo, gritando: “Seu animal de rabo!” Naquele instante, a seleção brasileira de basquete perdeu um provável titular.

Poderia alinhavar outros tantos naufrágios, mas prefiro publicá-los homeopaticamente.

De qualquer modo, está feito. Na semana que vem, vamos parar as rotativas com uma ótima e inédita história de fracasso, pelo menos uma boa dose de esforço?

E se você tem uma boa história dessas, verdadeira, mande pra cá. Afinal, o único fracasso possível no caso dessa série seria ter de encerrá-la por falta de assunto. O que seria um sucesso.

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